Todos os dias o caminhão do lixo passa na frente de casa. Meu filho sai correndo, vai até a janela. O motorista já aponta no horizonte procurando por ele.
Eles sorriem, mandam tchau.
Eu fico imaginando como é a vida desse motorista… Gosto de pensar que ele vira a esquina animado “Oba, vou ver meu amiguinho!”, um momento de alegria em um dia cansativo. Tão pequeno gesto, alguns segundos em meio a tantas horas de trabalho. Um refresco num dia quente, sombra para o sol forte.
Penso que o Jorge (nome fictício que dei para o motorista) volta para casa e avisa a mulher “vi meu amiguinho de novo”. Para ela não significa grandes coisas. Também está cansada de um dia de muito trabalho, talvez como minha sogra, atendendo no balcão de uma padaria qualquer, pensando que o Jorginho (filho fictício) ainda não fez a tarefa e não está com fome para jantar porque comeu alguma porcaria meia hora antes.
Todo dia. Todo dia o Samuel corre para ver o motorista. Mas vez ou outra não estamos em casa. Vez ou outra o caminhão passa num horário diferente e o Samuel está doente.
Fico pensando que o caminhão aponta, Jorge vem animado, mas o olhar se perde sem encontrar seu amiguinho. Aquele sorrisinho infantil e inocente, alívio no meio da malícia dos caras ao redor, não está lá. Sei lá, isso me lembra aquele filme do Akita (cachorro japonês) com o Richard Gere (eu acho) que todo dia espera o dono chegar. Até o dia em que o dono não volta.
Ok, triste, o cara morre, estou sendo um pouco dramático aqui na comparação, mas, sei lá, é que isso me faz lembrar de quando eu era criança. Ia para a aula e ficava todos os dias com o segurança do colégio esperando meu pai chegar para me buscar.
Meu pai chegava bem tarde e, muitas vezes, eu era o último aluninho ali, sentado no portão, esperando. Minha única companhia era o segurança. Mas eu também era a única companhia dele. A gente virou amigo, ficava ali conversando. Fico pensando que ele sentiu minha falta quando cresci e parei de ser o companheiro de trabalho dele, dando uma trégua nas conversas sempre muito sérias e políticas que acontecem entre adultos.
A real é que uma criancinha sorrindo para você no meio de um dia cansativo de trabalho é uma lembrança. Uma lembrança de que sempre devemos fazer o bem, mesmo no menor ato, mesmo que seja só num simples sorriso.
Porque nunca sabemos o que um pequeno ato de bondade nosso pode fazer por quem o recebe.
Ainda vou descobrir o nome verdadeiro do Jorge.
Ainda vou comprar uma coca bem gelada e falar para ele dar uma pausa de 5 minutos e se refrescar aqui comigo e com o Samuel.
O lixeiro passa aqui na frente todo dia. Ele é o responsável por me livrar de todas as sacolas de fraldas sujas e fedidas do Samuel que se juntam em uma semana. Sem o lixeiro, cara do céu, eu tava fodido. O que faria com todo esse lixo?
Eu preciso agradecer ele.
E deixar o Samuel, ao menos uma vez, dar um abraço nele, para, quem sabe, fazer o dia dele ainda melhor.
Te vejo amanhã.
AMDG
Elton